quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

24 de dezembro




Lúcia já estava dentro do avião, devidamente acomodada na poltrona, quando a tempestade começou. Logo o comandante anunciou que o voo infelizmente seria cancelado, mas que os passageiros teriam todo o suporte da companhia aérea.
Ela só se deu conta do que aquilo significava quando já estava no ônibus em direção ao hotel. Uma menininha com os olhos marejados questionava a mãe: "Como poderiam passar aquela data tão especial longe da família?" A mãe apenas a abraçava e dizia que tudo ficaria bem.
Lúcia, era aquela menininha, alguns muitos anos atrás. Era ela quem montava a pequena árvore na mesinha da sala, e escolhia o filme para ser assistido na noite do dia 24. A mãe preparava os pães de queijo, e assim que a fornada saía do forno, Lúcia separava os mais redondinhos para colocar na simpática vasilha de plástico. Quando ia dormir a levava para o quarto e coloca debaixo da cama. Ao acordar ela já não estava mais ali. Os olhos da menina brilhavam com a certeza de que ele, o Papai Noel, havia passado.
Mais especiais eram os encontros na fazenda da avó. Filhos e netos à luz de lamparina se acomodavam um ao lado do outro, e a cada novo ano celebravam aquela admirável união. Ela esperava ansiosamente aquele  momento mágico.
Lúcia lembrava-se ainda, da vez que brincara de Amigo da Onça com a família, e o quanto foi disputada entre ela e a prima mais nova, aquela bonequinha que vinha com uma banheira. A foto no velho álbum de fotografias do pai não a deixara mentir.  
Talvez tenha ficado naquele abraço dos avós. Ou ainda, nas histórias dos seus tios. Talvez no sorriso dos seus pais, na brincadeira com os primos. Lúcia não sabia aonde havia deixado a mágica do Natal que sempre alimentou tão bem durante a infância, e que agora se perdera.
Ela se prendeu a correria do trabalho, e acabou não dando o devido valor para o que realmente valia a pena. Poderia ter comprado à passagem com mais antecedência. Ligado para sua tia no aniversário de 50 anos. Escrito uma carta para os avós, um e-mail para o primo que passou no vestibular. Mandado entregar rosas para a mãe e compartilhado dicas de filmes com o pai.  Lúcia não fez nada disso. Há um ano não via a família, aqueles sorrisos que sempre lhe passaram segurança durante a infância. Há um ano não ouvia as mesmas histórias, não via aqueles rostos conhecidos.
Naquele momento ela nada poderia fazer. Apenas ligou para os pais para pedir desculpas e explicar a situação. A voz da mãe ao outro lado da linha saiu embargada, porém não menos afetuosa.
Na manhã seguinte Lúcia acordou cedo e passou em casa, embalou o essencial e disse para a colega de apartamento que um dia voltaria para empacotar o restante das coisas. Foi até o emprego e pediu contas.
Antes de embarcar ela olhou para trás e agradeceu por tudo o que tinha vivido ali, com a certeza de que sua vida agora seria diferente e inquestionavelmente especial. Finalmente estava voltando para o seu lugar no mundo. Lugar que sempre procurou, e que só agora conseguiu enxergar. 

Fim!


*Quero agradecer muito a duas queridinhas que colaboraram com o texto de hoje: A Anatália do blog Outros Abraços e a Vanessa do Favo de Sonhos. Chaturinhas, obrigada pelo carinho e por compartilharem as histórias de vocês comigo. Espero que tenham gostado do “textim”!!!

Até o próximo post!!!

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